sexta-feira, 1 de setembro de 2017

Hélder Costa

“Conheci o Zeca em Coimbra, numa altura em que ele já não vivia lá mas ia lá muitas vezes. A primeira vez que o ouço era um caloiro, tinha acabado de chegar. Estava na República do Prá-Kis-Tão, eram três ou quatro da manhã quando comecei a ouvir um gajo a cantar. Os mais velhos disseram logo que era o Zeca. O Zeca subia, sozinho, a cantar com uma voz extraordinária. O primeiro impacto foi, portanto, de um romântico, algo relacionado com o romantismo do século XIX”

“Ele tinha amigos em várias repúblicas, na Prá-Kis-Tão, nos Incas, na Rás-Te-Parta, e ia dormindo por lá. Foi-se criando uma amizade entre a malta. Dava-nos conselhos engraçadíssimos, como dizer-nos que devíamos comer bolos com creme porque alimentavam mais. O Zeca passou a vida a dar-me conselhos”

“Lembro-me perfeitamente que um dia estava na Rás-Te-Parta e o Zeca estava a dedilhar umas coisinhas, que haviam de dar origem à “Menino d'oiro”, e da alarvidade daqueles que diziam que aquilo era uma “mariquice”, todos indignados porque já não era o fado de Coimbra”

“Ele dormia várias vezes lá em casa. Um dia, estava eu a dormir e ouço: “Ó Hélder, Hélder!”. Levanto-me e estava o Zeca no fundo do corredor, de perna cruzada. Diz-me: “Este cão vai ladrar toda a noite?”

“A última vez em que estivemos juntos foi num dia absolutamente tétrico. Foi o dia em que o Cavaco foi a eleições e ganhou com maioria absoluta. O Zeca ligou-me para ir ver as eleições em casa dele em Azeitão. Disse-me que a Zélia não estava e que estaríamos sozinhos. Foi um dia inteiro em pânico. (…) Lembro-me que, quando a transmissão acaba, o Zeca diz-me:

'Ó Helder, e agora?”

daqui:

http://www.esquerda.net/dossier/o-zeca-passou-vida-dar-me-conselhos/47159

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